terça-feira, 7 de abril de 2009

Massa indigente, miséria latente

Ainda hoje num dos vários sinais, que além de nos “obrigar” a exercer a cidadania bipolar na relação com o pedestre e no respeito a rubra referência, que nos previne de possibilidades de choques sociais cada vez mais evidentes, constatei que a nossa imparcialidade como seres humanos e impassividade como cidadãos está cada vez mais sendo posta à prova, testada e forçosamente estabelecendo uma reflexão, impondo praticamente o mínimo de sensibilidade, nos expondo diante de nossas fragilidades. Senti-me culpado por ter me alimentado há poucas horas, ao ver a expressão cênica do Brejo da Cruz, lírica buarqueana entranhada na nossa sociedade. Mães miseráveis, crianças em bando – malabaristas de barriga grande, estômagos vazios – canelas finas equilibrando infâncias perdidas, alimentando-se de luz, transformando a dureza do asfalto, da cidade partida, desigual.

- Tio, pode buzinar?

Estarrecido - eu estava de vidro aberto e já tinha negado uma gorjeta, deixada há 10 minutos e 200 metros atrás – concedi o talvez primeiro contato daquela criança, com o bem mais simples e intangível pra ele, embora certamente presente em seus sonhos. Ele teve acesso ao volante, e em poucos segundos, com minha permissividade incomum naquele ambiente hostil, outros já faziam o mesmo. Um deles, mais esperto e com “conhecimentos automobilísticos” apertou o botão do pisca alerta e foi conferir feliz a efetividade do mecanismo na lanterna traseira; um terceiro posou a mão sobre o volante, e sem forças, pediu que apertasse sua mão e o ajudasse a talvez sua única alegria simplória naquele dia. Um ato ínfimo. Fui feliz por esse momento.
O sinal abriu. O carro de trás, alheio a tudo isso, fez questão de me avisar histericamente.

12/03/2006

Um comentário:

  1. Cassio Brito] [www.cassiobrito.com]
    "A novidade, que vem do brejo da cruz, é a criancada se alimentar de luz..." Valeu negao, por alimentar-los!!

    30/01/2006 16:09

    [Chico Lucas] [www.co-autores.zip.net]
    É, criolo. Já passei por experiências parecidas. Mas o garoto pediu minha chuteira, que estava no chão do carona. Infelizmente, não pude colaborar. Estava indo jogar no Baiano. Um abraço. E continue escrevendo.

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